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26/04/2022 - 15h50m

ARTIGO

Remédio para Doido é um Doido e Meio

Por Darlan Gomes de Aguiar

Existe um ditado antigo que remédio para doido é um doido e meio.

Darlan Gomes de Aguiar, advogado e professor (Foto: Divulgação)

Referido ditado é empregado para atos de combate a outro ato igualmente tido por desarrazoado que causasse grande celeuma ou discussões (por qualquer motivo).

Este ditado cai bem ao que hoje estamos vivendo quando confrontamos os atos praticados pelo Supremo Tribunal Federal com os da Presidência da República do Brasil.

Quanto ao STF, em primeiro lugar, é duvidosa a relativização da imunidade conferida aos parlamentares, nos termos que são conferidos pelo artigo 53 da Constituição Federal, especialmente porque a crítica e os ataques (não republicanos e não recomendáveis) foram feitos por um Deputado Federal contra atos de um órgão do Governo. Cousa natural de ocorrer em qualquer democracia.

Parlamentar tem origem no vocábulo Parlar, alusão à forma mais utilizada pelo Parlamentar, que é a palavra, e pelo uso desta, não pode ser punido.

E os exageros? Estes seriam, se houve quebra de decorro, resolvidos pela própria Casa Legislativa, posto que a Imunidade Parlamentar resguarda a inviolabilidade civil e criminal, quanto à Palavra, seja em sua opinião, manifestações pessoais e votos.

Logo, embora não exista liberdade plena, há proteção à liberdade do Parlamentar se manifestar justamente por ser este, em especial os deputados federais, representantes do Povo (art. 45, CF/88) e, dada esta representação, devem ser vigilantes sobre os atos que o Governo pratica, podendo, em qualquer caso, promover críticas e sugerir mudanças, inclusive fechamento de órgãos ou mudança em seus regimes ou estruturas. Por isso, no artigo 53 da CF/88 não existe ressalva ou limitação, verificando-se claramente o termo “quaisquer”.

Segundo, o caso não parece se amoldar à situação de flagrância porque o vídeo estar no ar não configura esta situação, bem como em razão de que a prisão em flagrante, no caso do deputado, somente se o crime fosse inafiançável (Não é, tanto é que, posteriormente, se concedera fiança). Por outro lado, a prisão em flagrante deve durar apenas 24 horas, depois disso, ou deve haver a soltura (regra) ou a conversão do flagrante em prisão preventiva (fato impossível de se aplicar para deputados federais), o que afastaria ainda a obrigação do uso de tornozeleira.

Terceiro, o deputado fora impedido de acompanhar seu próprio julgamento. Este é, talvez, um dos maiores absurdos, por violar, de forma clara, o Princípio Constitucional da Ampla Defesa, e da publicidade plena aos atores do processo.

Por fim, o Ministro, suposta vítima do crime, estaria suspeito para julgar, o que, também viola o devido processo legal, especialmente quanto à imparcialidade do Juízo e violação do princípio acusatório.

Some-se a este final, a retaliação aberta à defesa do deputado, impondo ao Advogado deste multa, sem justa razão e impedindo o regular exercício da defesa. Certamente, a OAB deverá tomar providências.

Ressalvo que a ninguém é dado brincar com a Democracia e a preservação das instituições democráticas, mas estas não estão isentas de crítica, e em especial, cabe ao Parlamento, promover, por seus diversos representantes, as críticas às instituições que possam entender que não estão funcionando adequadamente.

Porém, depois de tudo isso, vem coisa, se não igual, pior.

A estabilidade das relações jurídicas dependem do respeito às leis.

A Constituição Federal dá ao Poder Executivo o poder de conceder indulto ou graça, mas isto não implica que tal concessão seja feita a qualquer momento ou sob o talante que quem o concede.

No caso em apreço, mal saiu o resultado do julgamento, o Presidente da República editou o decreto concedendo graça ao deputado que teve condenação (sem trânsito em julgado) no Supremo Tribunal Federal.

A graça (individual) e o indulto |(coletivo) são as formas mais antigas de extinção da punibilidade. É um ato de clemência do governante (indulgência principis), justificada, muitas vezes, pela necessidade, não rara, de atenuar os rigores exagerados das sanções penais, muitas vezes desproporcionais aos crimes praticados.

O decreto é, salvo melhor juízo, inconstitucional e, igualmente ao julgado, não obedeceu regras constitucionais e legais.

Primeiro, porque a concessão da graça carece que exista uma sentença transitada em julgado porque ninguém é considerado culpado sem que esta condição se satisfaça (art. 5º, LVII, CF/88).

Segundo, porque tal concessão, apesar de ser ato privativo do chefe do Poder, não é discricionário, e, em razão disso, não pode ser feito, sem prévio processo administrativo, onde se ouça ou se cientifique, as autoridades e órgãos responsáveis pelo cumprimento da pena. Ao que se sabe, nenhum incidente, petição ou provocação (ainda que do Presidente da República) fora feito para fins da concessão da graça.

Por fim, os fundamentos deveriam ser outros.

Nota-se que os fundamentos do decreto afrontam igualmente as instituições ao fazer contrapondo ao julgo, afirmando que liberdade de expressão é pilar essencial da sociedade em todas as suas manifestações (o que é correto), porém, incorre no mal conceito de se contrapor ao decidido pelo STF, o que somente pode ser feito por meio de recursos, invoca ainda no ato que o mesmo tem por objetivo a manutenção do mecanismo tradicional de freios e contrapesos na tripartição de poderes; bem como considerou que a sociedade ficou comovida pelo caso (não se sabe que parcela da sociedade), ante a condenação de parlamentar resguardado pela inviolabilidade de opinião deferida pela Constituição, que somente fez uso de sua liberdade de expressão.

Pela forma dos considerandos e diante da situação fática posta, está claro que o Presidente da República fez a defesa de um correligionário e um amigo pessoal. Há, sob esta ótica, clara violação ao princípio de equidistância, posto que houve desvio de finalidade do instituto ante a impessoalidade do ato.

Mas, como citamos no início, remédio para doido é um doido e meio.

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1 Comentário(s)

  • Luís Roberto | 26/04/2022 | 21:07 Parabéns dr Darlan,belo texto bem fundamentado é o remédio de doido é doido e meio.
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